eu não queria ser você. não. não tendo que carregar sempre consigo os olhos mais bondosos de um mundo adoecido e ser sempre “a última que morre e a primeira que nasce”. eu não queria ser você, desse jeito que as coisas andam. são tantas noticias tristes, são tantos dias pandêmicos, são tantas incongruências. seria mais fácil apenas deixar levar, deixar seguir e ver no que ia dar. mas não, nobre guerreira, eis você firme e forte, renascendo umas dez milhões de vezes por dia em muitos seres humanos que conhecem o teu sabor. você é doce, querida, mas não á fácil te sentir. teu gosto some diante do amargor de notícias, de morte, desse genocídio, do não uso de mascaras, das aglomerações mesmo que mínimas que a maioria de nós, hipócritas, consolidamos aqui e ali. teu gosto é infantil, utópico, forte, maduro e ingênuo. teu sabor é de luzes de natal, estômago cheio, casa própria. há dias eu tento escrever e só sai a mesma coisa: até quando, querida? até onde vamos chegar? e assim, eu solto tua mão e me vou. você me pede para não desistir, mas como? meu corpo doi, meus olhos querem des(ver), meu corpo quer descansar, mas ao mesmo tempo grita. pois descansar nessa guerra civil parece privilegio para 1% do mundo. sei, não deve ser assim. mas como não ser? eu não queria ser você, esperança, mas sei que era tudo o que eu queria: ter você inabalável. mas, sorrio mesmo que fraco, se eu tivesse você a todo o tempo, você seria presente e não presença. você não seria você. então quero, mesmo não conseguindo, (ser) (ter) (sentir) você.

15/10/2021